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Arquitetos: OMA
- Área: 45000 m²
- Ano: 2017
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Fotografias:Iwan Baan, Hans Werlemann, Muhasin Mohamed
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Fabricantes: Cricursa
A biblioteca por Rem Koolhaas
O impacto físico dos livros sempre foi muito importante para minha formação. A primeira vez que me fascinei com livros foi quando li os contos dos irmãos Grimm ilustrados por Gustave Doré. Ainda me lembro da natureza física desses livros, eles fazem parte de uma das lembranças mais vívidas de toda minha infância. Na década de 50, eu passava praticamente todo meu tempo livre na biblioteca do Museu Stedelijk - como se fosse a sala de estar da minha casa. A primeira vez em que a escrita e a arquitetura se cruzaram em minha vida foi em Delirious New York, que escrevi na Biblioteca Pública de Nova York, enquanto pesquisava em microfilmes, jornais antigos e livros. Eu tinha um lugar cativo na biblioteca onde eu passava praticamente todos meus dias e noites.
A arquitetura e a escrita são muito semelhantes em suas historias e tradições, assim como ambas devem constantemente estar atualizadas para sobreviver. Nós, no OMA, projetamos muitas bibliotecas e construímos apenas algumas. As bibliotecas, tipologicamente falando, nos permitem pensar e desenvolver uma arquitetura excepcional, radical. Aparentemente, há um paradoxo. Um programa extremamente tradicional mas que nos leva ao mesmo tempo inventar novas soluções, e isso é exatamente o que fizemos no projeto da Biblioteca Nacional do Catar. O edifício é enorme, equivalente ao comprimento de dois 747. Não se trata apenas da escala, mas porque desde o início pensamos em criar um espaço acessível e estimulante para a população de todo o pais. A ideia era criar um edifício com um grande espaço único, sem divisões ou seções diferentes, certamente não deveríamos separá-los em diferentes pavimentos.
Pegamos a planta do térreo e dobramos para cima as suas bordas inclinando as laterais de forma a criar uma arquibancada para os livros além de permitir que o acesso principal ao edifício acontecesse bem no meio deste grande espaço cercado de livros. Você se vê imediatamente em meio a coleção da biblioteca, literalmente - todos os livros fisicamente presentes, visíveis e acessíveis, sem qualquer dificuldade. Esta biblioteca é um espaço que pode abrigar um mundo de pessoas e também, um mundo de livros...
Descrição do projeto
A Biblioteca Nacional do Catar é composta pela Biblioteca Nacional, a Biblioteca Pública e a Biblioteca Universitária de Doha, além do centro de preservação da Coleção do Patrimônio Histórico do Catar, a qual contém uma série de textos e manuscritos de valor imensurável relacionados à civilização árabe-islâmica. A biblioteca pública abriga mais de um milhão de livros distribuídos em uma área de 42.000 m2. Ela faz parte da nova Cidade da Educação, um campus criado em Doha para hospedar às principais universidades e instituições do mundo todo.
A Biblioteca Nacional do Catar é o projeto inaugurado mais recente do OMA, fruto de um trabalho de pesquisa interminável sobre o tema que remonta à competição da Biblioteca Nacional da França em 1989. Naquele momento, a “revolução digital” parecia “eliminar toda a necessidade de acumulação e incorporação física” do conhecimento (S, M, L, XL). Toda a raison d'être de uma biblioteca estava sendo questionada: ainda precisamos de bibliotecas? Elas sobreviverão à era digital? Com o projeto da Biblioteca Nacional do Catar, queremos expressar a vitalidade do livro físico, criando um design que reúne o estudo, a pesquisa, a colaboração e interação das pessoas dentro do próprio acervo - uma coleção que consiste em mais de um milhão de volumes, entre os quais alguns dos mais importantes e raros manuscritos do Oriente Médio.
A biblioteca é concebida como um espaço único que abriga tanto os livros quanto as pessoas. As bordas do edifício estão elevadas do chão, criando três corredores principais que acomodam a coleção de livros e, ao mesmo tempo, envolvem um espaço central triangular. Essa configuração também permite que o visitante acesse o edifício a partir do seu centro, em vez de entrar pela periferia, longe do conteúdo da biblioteca. Os corredores foram projetados como uma topografia de prateleiras, intercaladas com espaços para leitura, socialização e pesquisa. As estantes são parte do edifício, tanto em termos de materialidade - elas são feitas do mesmo mármore branco utilizado na biblioteca - e de infraestrutura - elas tem incorporadas sistemas de iluminação artificial, ventilação além de um sistema automático de retorno de livros.
Um volume em forma de ponte atravessa todo o espaço da biblioteca conectando os seus principais corredores, permitindo uma variedade de percursos através dos seus espaços. Esta estrutura é também um espaço para encontros e reuniões: abriga as salas de mídia e estudos, mesas de leitura, mostruários de exposições, uma mesa de conferência circular e um grande auditório polivalente, cercado por uma parede retrátil projetada pelo estúdio de Amsterdã InsideOutside, responsável também pelo projeto de paisagismo.
A coleção de livros raros foi colocada bem no centro da biblioteca em um espaço rebaixado de seis metros de profundidade, completamente revestido em travertino bege. A coleção principal opera de forma autônoma, diretamente acessível a partir do exterior. As fachadas de vidro corrugado filtram a luz natural, criando um ambiente tranquilo e agradável para a leitura. A luz difusa é direcionada para o centro do edifício por um sistema de forro reflexivo em alumínio. Do lado de fora, um pátio rebaixado permite que a luz natural entre no espaço administrativo da biblioteca que fica no subsolo e, ao mesmo tempo, atua como espaço de transição aonde os visitantes submergem para imergir em um mundo de livros.
A Biblioteca Nacional do Catar desempenha um papel central no Campus da Educação, um projeto idealizado por Shiekha Mozah e pela Fundação Catar como parte do projeto de transição do Catar para uma economia baseada no conhecimento. O plano diretor foi projetado por Arata Isozaki em 1995 e inaugurado em 2003, o qual consiste maioritariamente em instalações de ensino e pesquisa, incluindo filiais de universidades internacionalmente aclamadas e a sede da Fundação Catar, também projetada pelo OMA e concluída em 2016.